Quem é Hugo Carvalho?
Um português com vontade de fazer coisas. Não sou novo o suficiente para saber tudo (como as crianças), não tenho certezas absolutas e não sou moralista. Gosto de ser livre e tenho pouco apreço por conservadorismos e corporativismos.
Durante o teu percurso académico tiveste um forte envolvimento no associativismo estudantil, nomeadamente na Associação de Estudantes da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto e na Federação Académica do Porto. Em que medida é que essas experiências te moldaram?
Tive no movimento associativo estudantil a primeira linha de resposta ao que eu costumo chamar de “experimentar a democracia”. Candidatei-me a eleições, perdi, ganhei, prestei contas, fiz oposição e lidei com pessoas muito diferentes, com histórias muito diferentes que, no fim das contas, me obrigaram a ser sempre melhor.
Posteriormente, foste Administrador da Federação Académica do Desporto Universitário. Achas que o desporto universitário já é devidamente valorizado pelas instituições de ensino superior?
Não se pode admitir a alguém que lidere uma instituição de ensino superior que não reconheça o valor do desporto no desenvolvimento humano. Tenho a convicção de que a valorização que umas ou outras IES dão ao desporto universitário está intimamente ligada com a forma como o fazem acontecer dentro das suas portas. Sempre que os senhores reitores e presidentes de politécnicos derem recursos aos estudantes para que eles possam ser mais a praticar desporto, devemos ficar contentes. Sempre que os senhores reitores e presidentes de politécnicos derem recursos aos seus gabinetes para competirem uns com outros por medalhas, devemos recordá-los de que o desporto universitário é para os estudantes.
Estás desde janeiro de 2016 à frente do Conselho Nacional da Juventude. Na tua opinião quais é que são os principais desafios que a tua geração enfrenta?
Tenho feito o meu melhor para conseguir responder a esta pergunta de forma justa para todos os jovens que passam por tantas dificuldades diferentes. Mas, pensando bem, há um desafio que se pode eleger: o acesso. Acesso à profissão, contra o corporativismo das ordens profissionais e dos seus dirigentes que se acham donos do seu ofício. Acesso à habitação, aguardando políticas públicas que equilibrem o mercado e que facilitem a emancipação dos jovens (há umas gerações atrás havia 90 milhões por ano, hoje não chega a 20...). Acesso à decisão, num sistema envelhecido, que vai arranjando mais uns fóruns para ouvir os jovens, mas que não arranja coragem para partilhar com eles o poder da decisão. Acesso ao futuro, quando o investimento se canaliza para desbloquear carreiras, repor salários, repor pensões e deixa de fora a inserção de jovens no mercado de trabalho que, com os seus impostos, possam suportar as gerações anteriores.
Em que é que o Conselho Nacional da Juventude pode ajudar os jovens do nosso país a terem melhores perspetivas futuras?
Disse no início da entrevista que não sou moralista. E, portanto, não digo a ninguém o que deve fazer nem como deve de viver. O CNJ é uma plataforma política de representação dos jovens. O melhor que pode fazer é motivar os jovens a ajudarem-se a si próprios. Ou estamos em força na política e na decisão, ou as nossas perspetivas de futuro vão ser as do imediato ou as do passado. Temos de querer a geração mais política de Portugal, sob o risco de abordarmos problemas novos apenas com soluções velhas.
Há quem aponte a falta de interesse dos jovens, nomeadamente no que diz respeito à abstenção em atos eleitorais, por exemplo. Tens contestado essa ideia. O que pode ser feito para mudar essa perceção?
É natural que exista esta impressão de que os jovens não se interessam e não querem saber por parte de uma geração mais antiga; até porque somos assim noticiados pelos meios de comunicação tradicionais. Desde logo, existe a questão de que tudo o que fazemos hoje é comunicado de forma difusa: pelas nossas próprias redes sociais, pelos nossos canais, pela nossa rede natural. Ora, se os jornais e as redações também estiverem a envelhecer e não quiserem estar nessa realidade, então não admira que noticiem outra coisa. É preciso, hoje, muita imaginação para criar factos políticos que nos garantam um pequeno espaço na opinião pública. Quanto à abstenção, ela nunca foi medida por idades. Mas ainda que seja elevada (porque é), não podemos apenas dizer que isso é negativo e que há uma geração que não presta porque não quer votar. Isso vale tanto como eu dizer que há uma geração que não presta porque não quer facilitar a existência do voto à distância, por exemplo. Quem mais pode fazer para mudar essa ideia somos nós, jovens. Mas enquanto não conseguirmos conquistar um capital político que nos garanta poder de decisão, não vamos conseguir nada. Mobilizarmo-nos por esta causa de mudar, dentro dos partidos por exemplo, é algo que temos urgentemente que fazer.
Recentemente, o Governo apresentou uma proposta de lei para alterar o regime jurídico do associativismo jovem. Qual é a tua opinião sobre a mesma?
Eu pessoalmente teria ido mais longe. Não compreendo as razões de dizermos que os jovens têm de liderar o seu futuro quando até nas suas próprias organizações, que o Estado financia para motivar o associativismo e o voluntariado nos mais novos, queremos permitir que o passado possa mandar. Teria exigido às Associações Juvenis que fossem 100% constituídas por jovens. Permitir que continuemos a financiar mais rápido a Feira do Sarrabulho do que qualquer projeto de Direitos Humanos, intercâmbios ou causas ambientais; permitir que continuemos a financiar mais as organizações que têm o mesmo presidente há 30 anos e menos as dos jovens que querem dar um pouco de si pela primeira vez; é dizer aos jovens que têm a força da inovação, mas para a guardarem na gaveta e irem para as organizações que já existem. As dos jovens de há 40 anos. Acho que a proposta de lei feita pelo Governo dá um grande passo em frente no setor. Exige que os que se tentam eternizar nas estruturas deem lugar aos jovens e, caso não o queiram fazer, mas consigam demonstrar o valor do seu trabalho com jovens, que o façam também dentro do setor da juventude, mas não como organização de jovens. Não se deixa ninguém para trás, não vai acabar nem uma associação. A menos que já não seja jovem, nem de jovens, há mesmo muito tempo.
No Ensino Superior, são também muitos os desafios que os estudantes enfrentam. Como encaras a recente decisão de diminuição do valor das propinas e a insuficiência da ação social, nomeadamente no que diz respeito à oferta pública de alojamento e de residências universitárias?
Esta pergunta é de resposta rápida. Se fosse Ministro do Ensino Superior e tivesse mais 50 milhões de euros no meu orçamento, construía residências onde elas fazem falta. Tentava poupar 400 euros por mês a muitos estudantes em vez de poupar 200 euros a todos. A descida das propinas é uma medida positiva e politicamente inatacável. O impacto das medidas nem sempre corresponde ao seu alcance político. Muitas vezes parece que estamos apenas a atirar dinheiro para cima dos problemas.
Tens criticado também a regulação do acesso à profissão, nomeadamente por parte das ordens profissionais. Como é que julgas que a situação poderia ou deveria ser revertida?
Se tivesse de escolher uma coisa para fazer, seria obrigar todos os profissionais (novos e antigos) a renovar as suas carteiras profissionais. Tenho a impressão de que o acesso à Ordem dos Advogados, por exemplo, seria bem mais fácil se os senhores e senhoras que já estão na profissão há muito tempo fossem também sujeitos à mesma avaliação. No fundo, gostava que se julgassem os profissionais pela qualidade, em vez de ser apenas pela idade.
Portugal vai receber a Conferência Mundial de Ministros da Juventude em 2019. O que poderemos esperar deste evento?
A Juventude é umas das áreas políticas em que Portugal tem vantagem comparativa a outros países, em termos de cooperação internacional. A primeira Conferência Mundial de Ministros de Juventude realizou-se em Portugal há 20 anos atrás, na qual se comprometeram os Estados Membros da Organização das Nações Unidas com uma agenda global de juventude, de cogestão, de codecisão, de valorizar o associativismo juvenil e de promover políticas públicas de juventude por um futuro melhor. 20 anos depois, o mundo mudou, os sonhos do milénio congelaram com o 11 de setembro e surgiu uma nova agenda global para o desenvolvimento sustentável e para a erradicação da pobreza que não pode ser concretizada sem a força inovadora das novas gerações. É hora de olhar para o plano mundial de ação para a juventude de novo, de olhar para a política global, de perspetivar o futuro com a geração mais global de sempre à mesa. #connosco
Onde te imaginas daqui a 10 anos?
Algures na Europa, com uma carreira profissional sólida e, claro, na política!
Que mensagem gostarias de deixar aos jovens da Universidade do Minho?
Termino como comecei: não sou moralista e não sou melhor do que nenhum jovem para fazer nenhum tipo de comentários sobre a forma como estão na vida. Todos queremos ser felizes, à nossa maneira. Mas nunca fomos tão precisos como agora. Se não quisermos voltar à política, se não quisermos que a política seja melhor do que alguns que lá se perpetuam, se deixarmos a política apodrecer, se deixarmos os partidos e a democracia, vamos estar a enterrar todos os nossos sonhos sem nos apercebermos disso. Ninguém faz nada sozinho. Façam política, respirem política, sejam estudantes, não sejam alunos.
Texto: Ana Marques