O que te
levou à UMinho e ao curso de Relações
Internacionais?
Fui para a UMinho
porque constatei ser uma Universidade dinâmica, inovadora e de
certa forma pioneira no Curso de (R.I) Relações Internacionais em
Portugal. Escolhi o curso de R.I porque se enquadra com o meu
perfil. Reparem, nasci em Moçambique e depois vim para Portugal
onde mais tarde me naturalizei. Desde pequeno sempre estive
inserido numa atmosfera internacional (o circulo de amigos que
frequentava a casa, no desporto, e quando viajava). Antes da
UMinho passei por dois outros cursos - psicologia e engenharia
informática. Ao fim de dois anos, logo percebi que o meu lugar
era nas R.I.
De que forma
é que a tua escolha moldou o teu futuro
profissional?
Estudar R.I
permitiu-me ter uma visão mais depurada da cena internacional
(meio ao qual eu de certa forma já estava familiarizado). As R.I
deram-me as ferramentas necessárias para voar e facilmente
enquadrar-me neste mundo cada vez mais complexo, heterogéneo e
dinâmico. O meu perfil também teve um papel preponderante;
contrariamente à maioria dos meus colegas de curso, sempre fui
optimista e ávido a tomar riscos na vida ? it paid off!
Como é que
foram esses anos na academia minhota?
Os anos na academia
minhota foram excelentes. Sempre fui um aluno empenhado,
brinquei, namorei muito, fui activo no Núcleo de Estudantes de
R.I, fiz parte do grupo de teatro no departamento de línguas
(inglês e francês), ao mesmo tempo traduzia textos online para
uma Agência Canadiana; sem falar da minha actividade como monitor
de ténis da UM e também como atleta de competição - pena somente
vice-campeão nacional Universitário!
Como é que
se deu a tua entrada para o desporto na
UMinho?
Desde dos 4 anos que
jogo ténis. Aliás toda a minha família joga (va). O meu objectivo
era ser profissional de ténis. Acontece que o ténis é
extremamente caro e a minha mãe não podia custear as despesas ao
mais alto nível. Continuei a jogar e a instruir-me acerca da
modalidade (...) e ao chegar na UMinho idem.
Que atividades desportivas praticaste na
UMinho?
Na UMinho pratiquei
essencialmente ténis. Uma vez e outra jogava basquete ou
nadava.
O que te
levou a escolher o ténis?
Como referi antes,
está nas veias, venho de uma família que joga (va)
ténis.
Que
recordações guardas do desporto universitário, das atividades
desenvolvidas na Universidade e pela
Universidade?
O desporto em geral
e o Universitário em particular são uma escola de vida. Dão-nos
equilíbrio a todos os níveis ? higiene de vida! O facto de ter
feito competição permitiu-me ainda desenvolver faculdades que até
hoje ajudam-me a superar o stress na vida profissional e pelo
mundo fora. As recordações são imensas a começar pelo número de
amigos que fiz, e tudo o que pudemos partilhar pela Universidade,
na Universidade.
Qual foi o
momento mais marcante que tiveste enquanto envergavas a camisola
da UMinho?
O momento mais
marcante foi o dos jogos Universitários em Atenas. Senti o
espírito de equipa, e institucional (UMinho).
Achas que
foi importante (o desporto) no teu desenvolvimento enquanto
indivíduo?
Sem dúvida, aliás como referi anteriormente, o desporto tem-me dado ao longo da vida o equilíbrio necessário para enfrentar todo tipo de barreiras. É uma escola de vida, se considerarmos tudo aquilo que implica fazer desporto (dormir a horas, rigor, disciplina, empenho). A fórmula para mim é: desporto + Elias = boa higiene de vida! Ainda jogo ténis (mais sólido - liga Regional e Nacional Suíça) e acrescentei ainda duas outras modalidades, o ski e a BTT.
A entrada no
mundo profissional, como é que
aconteceu?
Enquanto estudante
Universitário fazia traduções e coordenava via online um projecto
da Agência Canadiana para o Desenvolvimento Internacional. Foi um
contacto que surgiu quando estive uma vez de férias em
Moçambique. Entretanto quando acabei licenciatura mudei-me para
Lisboa onde fiz o meu estágio no (IDN) Instituto da Defesa
Nacional. Ao mesmo tempo dava aulas de ténis no Restelo - CIF,
participei também de alguns projectos ad-hoc no âmbito de
Segurança e Defesa no IDN (...). No final do estágio novas
oportunidades surgiram; trabalhei inicialmente no privado como
coordenador de bases de dados na Cushman & Wakefield, (...).
Em 2008 vim para Zurique e depois Friburgo para trabalhar como
gestor júnior de fundos de pensões numa empresa Vonlanthen
Consulting SA; ao fim de um ano retomei à minha área de formação
R.I. Já em Genebra, trabalhei consultor ad-hoc de projectos na
Caritas Suisse; de seguida como consultor de projectos na OIM -
Organização Internacional das Migrações. Entretanto surgiu uma
proposta mais aliciante na Delegação Permanente da União Europeia
junto à OMC - onde trabalho até hoje como assistente de
administração. Nas minhas horas livres faço voluntariado para a
SwissAid - gência Suíça para o Desenvolvimento Internacional. É
minha responsabilidade social tête-à-tête com os mais
desfavorecidos. É uma vertente das R.I (humanitário). Permite
também alargar o capital social.
Foi difícil
essa passagem do mundo académico para a realidade do mundo do
trabalho?
Para mim,
praticamente não houve essa cisão, mutação ou dificuldade.
Enquanto estudante já me considerava activo no verdadeiro sentido
do termo (refira-se a questão "como foram esses anos na academia
minhota?"). A única mudança que senti foi a nível da taxa de
empregabilidade. Isto é, uma vez acabada a licenciatura começava
a concentrar-me unicamente no trabalho, à 100%.
Em que área
estás a trabalhar e quais são as tuas
funções?
Estou a trabalhar na
União Europeia (EEAS) - European External Action Service. É a
Missão permanente da UE junto à OMC (Organização Mundial do
Comércio).
Com o Tratado de
Lisboa anexou-se a nós a Delegação permanente da UE junto à ONU
(Nações Unidas).
Eu sou assistente de
administração. Sou responsável pela gestão budgetária de algumas
áreas específicas, coordeno o protocolo diplomático, coordeno as
vídeo/áudio conferências entre as diversas delegações da UE e
outras instituições; e faço todo o trabalho inerente à
Administração que por sinal é comum as duas secções, Missão
UE-OMC e Delegação UE-ONU. No total são 50 funcionários + dois
embaixadores por cada secção UE-OMC e UE-ONU.
Como é que
surgiu a oportunidade de trabalhar para a Organização Mundial do
Comércio?
Volto a precisar,
Missão permanente da UE junto a OMC. Trata essencialmente por
todas questões relacionadas ao comércio internacional.
A oportunidade foi
simples: o posto foi publicado num jornal local e eu
candidatei-me assim como outros tantos 100 candidatos. Após
análise do currículo, testes e um entrevista final, escolheram-me
para o cargo.
É
problemático trabalhar numa organização onde tantos interesses
estão sempre em jogo?
Não diria
problemático, mas sim sensível. Exige-se muita discrição por
parte do staff pois todas as decisões e assuntos debatidos devem
ser guardados com o maior sigilo. Sendo uma missão diplomática,
todas as medidas de segurança são poucas! É uma realidade que com
a actual conjuntura económica que afecta o mundo, tanto a UE, ONU
e a OMC têm sido fortemente criticadas. São ciclos históricos, é
preciso sair da caixa de Pandora, do drama, e analisar a actual
conjuntura com a cabeça mais fria, relativizando. Repare que em
qualquer parte do mundo, hoje em dia vive-se melhor que há 50
anos atrás.
Como é o
dia-a-dia do Elias Bene?
Vivo em Lausanne e
trabalho em Genebra, 27 minutos de comboio. Durante o trajecto
bebo o meu café e leio o jornal. Uma vez no gabinete começo a
tratar os dossiers que tenho e todo o trabalho que vai surgindo.
Quando termino o trabalho, dedico-me a outras actividades:
desporto, música, dança, ou simplesmente ir para casa
repousar.
Na tua área
de conhecimento, como é que está o mercado de
trabalho?
Na minha área de
conhecimento R.I o mercado de trabalho é vasto e há muitas
oportunidades. O que faz a diferença é o país onde nos
encontramos. Globalmente diria que a área das R.I está em forte
crescimento. O mundo hoje é multidimensional, heterogéneo e em
constante mudança. As R.I nesse âmbito ocupam uma posição
privilegiada sobretudo aqui na Suíça ? o viveiro de todos
organismos internacionais. Destaque para as Nações Unidas e todas
as suas agências especializadas. ONG's são muitas por cá (...).
Mesmo no sector privado o perfil R.I tem enquadramento sobretudo
se o candidato tiver experiência internacional e falar vários
idiomas.
Com a UE, Bruxelas é
um óptimo mercado. Para os mais ousados participar em programas
de voluntariado ou projectos de cooperação em países do
Hemisfério Sul - mercado lusotropicapital (PALOP, CPLP), é uma
mais valia, permite rapidamente subir de escalão e tornar-se
perito numa região ou uma área temática específica; chamamos isso
na gíria das R.I "experience in the field". É bem diferente da
perspectiva de gabinete de muita gente que trabalha opina e
escreve relatórios sobre questões de diversos países, sem nunca
ter colocado os pés no terreno.
Onde é que
te vês daqui a 10 anos?
Daqui a 10 anos é
uma meta ao longo prazo. Em economia diz-se que a ao longo prazo
estamos todos mortos. Eu projecto-me a curto/médio prazo, 5 anos.
Estou aberto a novos desafios, assim, se surgir uma oportunidade
para outro país, outro sector, porque não?
Achas que
Portugal está a produzir mão-de-obra qualificada a mais ou os
jovens licenciados estão apenas a pagar a fatura de uma crise que
levou muitas empresas à falência?
Falar de produção em
massa de mão-de-obra qualificada em Portugal é uma questão
sensível. Isso tem a ver com políticas públicas e objectivos
estratégicos que o país deve definir para levar a bom porto o seu
desenvolvimento. Acho que Portugal necessita sim de mais quadros
superiores, mas é preciso orientar essa formação superior em
função das reais necessidades do país. A Suíça, produz mais
técnicos médios especializados que "Doutores", e o país funciona!
Obviamente que os efeitos colaterais da crise fazem-se sentir em
todos tecidos da economia, sem falar na relação
empregador/empregado; daí a precariedade no recrutamento e
inserção do pessoal altamente qualificado ou
médio/precário.
Acreditas
que o Empreendedorismo é uma solução para alguns dos actuais
problemas dos jovens
licenciados?
Empreendimento sim,
mas o fundamental é ter as condições favoráveis para que esse
empreendorismo produza resultados. Isso depende do eleitorado,
infelizmente o cidadão comum tem pouca margem de manobra, mesmo
que apareça com a ideia mais brilhante.
É mais fácil
ser reconhecido pela nossa qualidade profissional cá dentro ou
achas que ainda existe a mentalidade de que quem vem de fora é
melhor?
É um pau de dois
bicos! Depende da conjuntura, do sentimento patriótico de cada
cidadão, auto-estima por si e pelo país. Depende da ênfase que se
quer dar a uma estratégia de expansão económica, marketing etc.
Enquanto trabalhei na OIM ? Organização Internacional das
Migrações, um estudo feito sobre inserção e empreendorismo
revelou que a taxa de empreendorismo de um estrangeiro é 1.5
superior a do nacional. Isso revela que quando há condições
favoráveis, o "produto" de fora traz valor acrescentado e
competitividade local.
Quando cheguei à
Suíça comparei a formação da Universidade de Genebra em Relações
Internacionais e surpreendi-me: o currículo da UMinho é mais
rico, sólido e abrangente. O mesmo acontece noutras áreas de
conhecimento. Isso justifica o bom desempenho dos quadros
portugueses exportados para o estrangeiro; os mesmos quadros em
Portugal vegetam!
O problema está na
falta do ambiente propício para capitalizar esse potencial. Quero
com isto dizer que há condicionantes na vida de um indivíduo que
têm um papel preponderante no seu sucesso, uma delas é o local
onde se nasce e onde se cresce. No futebol por exemplo, O
Cristiano Ronaldo é uma vedeta e marca muitos golos lá fora; o
mesmo Cristiano na selecção nacional não consegue fazer com que
Portugal ganhe a copa do mundo!
Em Portugal não é
uma questão de falta de reconhecimento da qualidade profissional
ou académica, o contexto e o ambiente é que não são propícios.
(para melhor compreender veja a questão seguinte).
Qual é a tua visão do estado atual de Portugal?
As famílias têm cada
vez mais dificuldades. É curioso, quanto mais nos aproximamos dos
países do Centro e Norte da Europa, apercebemo-nos do clima que é
mais rigoroso; por outro lado assistimos a um maior
desenvolvimento, competitividade e organização. Se olharmos para
o Sul da Europa, Portugal em particular, temos um clima mais
agradável; por outro lado vemos que ainda há muita coisa por
fazer até atingir os níveis de desenvolvimento e organização
desejados. Não percebo como é que há
desemprego!
O factor mental e
idiossincrático é também preponderante. Lembro da obra de José
Gil "Portugal hoje o medo de existir" que reflecte muito bem o
que é ser português: por vezes expansionista, ao mesmo tempo
retraído, optimista e com uma grande dose de pessimismo;
melancólico e nostálgico com medo de arriscar. Tudo isto é
paradoxal se olharmos para aquilo que foi a história dos
"descobrimentos".
Cabe a classe
dirigente criar mais confiança nos cidadãos, para que se possa
ultrapassar as dificuldades e desenvolver o país de forma
sustentável, em função das suas reais necessidades.
Que conselho
deixas aos milhares de estudantes da UMinho que procuram um
futuro mais risonho através de um curso superior?
Que aproveitem o
máximo da formação que lhes for proporcionada. Que alarguem os
horizontes, o capital social, estejam dispostos a novas
experiências sem preconceito. Tenacidade e paciência, para
atingir as metas desejadas implica muitas vezes um percurso pouco
linear, mas todas as etapas são importantes. Procurem identificar
o mais rápido possível as fraquezas, pontos fortes, e onde criar
oportunidades, tudo isso dá maior lucidez e faz a diferença em
termos qualitativos e das metas a alcançar. Saber apreciar cada
circunstância (boa ou má) como uma oportunidade. Lembrem-se do
provérbio "muitas das coisas que terminam com um grande sucesso
começam com uma grande adversidade".
Texto: Nuno Gonçalves
(Pub. Jan/2013)