AP (13)
Academia, 07.11.2022 às 12:31
Entrevista ao Administrador dos SASUM, António Paisana
Após cinco anos, e prestes a deixar a gestão da organização, o Administrador faz um balanço do trajeto à frente dos Serviços, assumindo que foi o maior desafio da sua carreira.

António Paisana é Administrador dos Serviços de Acção Social da Universidade do Minho (SASUM) desde 2017. Graduado em Economia e doutorado em Engenharia de Produção, trabalhou na área financeira e da gestão até ter ingressado como docente da Universidade do Minho, onde foi ainda, durante 5 anos, o primeiro Provedor do Estudante.  

Prestes a reformar-se, o Professor Paisana, como é comummente tratado, esteve à conversa com o UMdicas, onde nos falou do trajeto à frente dos destinos dos SASUM, do presente e do futuro da Instituição.

António Paisana é Administrador dos SASUM desde 1 de novembro de 2017. Passados cinco anos à frente da organização, o que nos tem a dizer sobre a experiência? Que balanço faz?

Os 5 anos de que fala – 2018 a 2022 – podem ser divididos em 3 grandes grupos, nomeadamente: 

O primeiro grupo engloba os anos de 2018 e 2019.

Os anos de 2018 (dado que tomei posse já no final de 2017) e 2019 foram de facto anos de enorme afirmação. Ao nível da exploração foram servidas perto de 700 mil refeições, 80% das quais foram refeições a preços sociais. No alojamento, a taxa de ocupação média foi de 99,30% e o número de alunos cujas candidaturas a bolsas de estudo foram analisadas e deferidas representou mais de 30% do total de alunos da UM – perto de 5 mil. Terminámos 2019 com as receitas próprias a atingirem um valor record – cerca de 6.2 milhões de euros -, os Serviços conseguiram uma autonomia financeira na ordem dos 68% e alcançou-se um resultado líquido positivo de 198 mil euros. Cumulativamente a estes dois anos, o saldo de gerência que transitou de 2019 foi de 1.784 milhões de euros. Foram ainda aprovadas alterações aos estatutos e alterações muito significativas ao próprio regulamento orgânico dos SASUM. Devo realçar ainda a elaboração do 1º Plano Estratégico de Sustentabilidade em fevereiro de 2018. 

O segundo grande período de tempo do meu mandato compreendeu os anos de 2020 e 2021.

Os anos de 2020 e 2021 foram claramente anos de fortíssima contração na atividade dos SASUM devido à pandemia. 

De facto, em 2020, de um total de 10 meses de atividade normal da Universidade, apenas janeiro e fevereiro apresentaram níveis de atividade e desempenho padrão. É bom recordar que o confinamento total durou cerca de 3 meses (março a maio), houve 2 meses sem qualquer atividade relevante (agosto e setembro – as aulas iniciaram-se em 6 outubro) e nos restantes meses as atividades letivas tiveram uma componente presencial muito reduzida.

A receita própria cobrada líquida, comparativamente ao ano de 2019, teve uma diminuição de cerca de 6.2 milhões de euros para não mais do que 2.7 milhões. Contudo, e por razões óbvias, as despesas com pessoal que representam normalmente cerca de 47% do total de despesas apenas tiveram uma redução de cerca de 42 mil euros. Todos os desequilíbrios causados pela pandemia resultaram num resultado do exercício líquido negativo de 1.2 milhões euros e um saldo de gerência de pouco mais de 1 milhão de euros.

O ano 2021 acabou por se caracterizar também por restrições muito significativas na atividade económica dos Serviços. O confinamento total durou cerca de 3 meses – de 22 de janeiro a 19 de abril, e o número de dias em confinamento foi mesmo superior ao verificado em 2020. Contudo, em 2021 o número de refeições servidas (cerca de 320K) aumentou 23% comparado com 2020, mas ainda 55% abaixo em relação a 2019, enquanto que o número de refeições sociais servidas em 2021 (230K) aumentou 7% em relação a 2020, mas ainda apenas a 59% do número de 2019. A taxa de ocupação de camas nas residências universitárias foi de cerca de 99,8%. No desporto, o valor total de receitas em 2021registou um aumento de 6,3% relativamente a 2020, mas ainda 20% abaixo do valor verificado em 2019.

O ano 2021 terminou com um resultado líquido negativo de 834k e um saldo de gerência, que transitou para 2022, de cerca de 557k. 

A expectativa que temos é a de que 2022 possa vir a ser o primeiro ano de um caminho de recuperação que nos leve a alcançar em 2023 um mínimo de 80% dos indicadores de desempenho alcançados em 2019.

Existem de facto sinais de recuperação ao nível dos volumes da procura nas áreas da alimentação e do desporto, já que no alojamento a procura tem superado a oferta disponível de camas. Por exemplo posso dizer-lhe que nas últimas 2 semanas de setembro o número de refeições servidas representava já 88% do número de 2019.

Contudo, o aumento nos preços dos bens e produtos – sobretudo alimentares, de energia, de gás e de pessoal – podem comprometer estas expectativas, em especial porque os preços regulados das senhas de refeições sociais não aumentaram – 2,5€ nos packs de 10 – assim como os do complemento de alojamento – 77,56€ por mês em quarto duplo com todas as despesas incluídas. Para se ter uma noção da dimensão deste problema, fizemos recentemente uma análise ao impacto do aumento nos preços de um cabaz de 30 produtos alimentares. Comparámos preços X quantidades consumidas em 2021 com os preços de 2022 e as quantidades consumidas em 2019 (quantidades que pretendemos voltar a atingir em breve). A diferença encontrada foi superior a 350 mil euros! Na energia, posso dar-lhe o exemplo dos montantes pagos em eletricidade nos meses de janeiro de 2021 e novembro de 2021 relativos à Residência de Santa Tecla: 13k€ e 40k€, respetivamente!

De facto, se não houver um compromisso forte do Governo e da Instituição no apoio à componente social da atividade dos Serviços que decorre da realidade que estes números espelham, então não haverá modelo algum alternativo à sua gestão que permita a sua sustentabilidade.

Para além destes desequilíbrios, enfrentamos ainda os desafios a curto prazo de um quadro de pessoal envelhecido e de constrangimentos inadequados a novas contratações, de chefias de divisões/gabinetes frustradas, de um quadro de contratação pública muito exigente e que requer muito planeamento a todos os níveis da organização. Adicionalmente, os resultados positivos que se vêm registando “escondem” um conjunto de investimentos que urge concretizar ao nível das infraestruturas e de equipamento.     

Como define a sua liderança? É fácil ter uma equipa motivada?

Procurei sempre que houvesse um compromisso muito firme do topo da estrutura dos Serviços a tudo o que fosse ideias inovadoras e de utilização de novas tecnologias - que promovessem a eficiência interna, mas também uma proximidade e interação mais rápida e expedita com os nossos utentes.

Por isso mesmo penso que fomos nós os que mais fizemos, os que mais partilhámos, os que mais entusiasmo e motivação mostrámos em todas as fases dos projetos europeus em que estivemos envolvidos no âmbito do Consórcio UNorte.pt. - desde as candidaturas à formulação e implementação das respetivas iniciativas.

Nunca teríamos tido recursos próprios suficientes para tantos avanços. Os SASUM não tinham, nem têm, recursos próprios que lhes permita crescer de outro modo.

Hoje já temos muito trabalho terminado e outro ainda de grande relevância em progresso e que terminará em 2023 (o POCER). As áreas cobertas foram e são extensivas a praticamente todas as atividades que fazem parte da missão dos SASUM e incluíram por exemplo as áreas da formação interna partilhada, da melhoria continua de processos e controlo interno com um documento elaborado pela Kaisen, de perspetivas de inovação de ementas, do desenho de programas de acolhimento/ acompanhamento dirigido aos novos residentes, do controlo da qualidade do ar em determinadas infraestruturas, da gestão integrada de documentos e processos, da desmaterialização do processo atual de gestão de senhas – através do desenvolvimento de uma aplicação móvel (em curso), da  criação de portais para os estudantes que envolverá a digitalização de todos os serviços prestados à Comunidade Académica, tornando o seu acesso mais rápido e cómodo e aumentando o compromisso com os utentes, para além de tantas outras iniciativas.

Foi este o caminho em que sempre acreditei e acarinhei. Ao todo estamos a falar de gerir cerca de 1.3 milhões de euros de financiamento.

Naturalmente que o nível da minha intervenção, em matérias da gestão dos 4 maiores departamentos dos Serviços, envolveu estabelecer princípios gerais e metas estratégicas, acompanhar e controlar resultados observando sempre os interesses do todo, dando liberdade a todos para o desenvolvimento de novas ideias e reconhecendo o mérito daqueles que mais fizeram para alcançar o sucesso do seu trabalho.

A expectativa era a de que traçar objetivos estratégicos em conjunto e sobretudo fixar caminhos que todos entendessem como sendo fundamentais, proporcionando confiança e vontade à concretização. E foi isto que eu procurei incutir nestes anos do meu mandato.

Estou por isso muito grato a todos os dirigentes e responsáveis que contribuíram de forma decisiva para os êxitos alcançados. Estou grato a todos os operacionais e administrativos que se disponibilizaram para acompanhar as mudanças. Porque as houve. A nível estratégico (focados em candidaturas bem-sucedidas a projetos europeus e aos seus resultados), organizacional (estatutos, regulamento orgânico, uma proximidade e abertura efetiva) e ao nível da exploração (conceito de unidade de negócio).

Sente que a sua missão está a ser bem-sucedida?

Estou tranquilo relativamente ao que fizemos nestes 5 anos.

Os Serviços passaram por muita turbulência interna logo que aqui cheguei. Houve então muitas mudanças nos cargos dirigentes e ainda outras mais recentemente.

Mas como disse anteriormente julgo que acrescentámos muito valor a uma base organizativa que eu sempre reconheci como bem consolidada. Em termos de definição de funções e de processos - mas também de resultados.

Só para lhe dar uma ideia do modo como utilizámos os fundos europeus, dou-lhe o exemplo do projeto CO3+ no valor de cerca de 600 mil euros, que terminou agora em 2022 e que teve uma taxa de execução de 89,91%.

Conseguimos também manter uma autonomia financeira à volta dos 60%. Isto é, mais de 60% das nossas receitas totais corresponderam a receitas próprias, incluindo as de projetos europeus.

E no que diz respeito a saldos em banco, depois de termos acrescentado mais de 170k€ em 2019, iniciámos 2020 com cerca de 1788k€. Os anos difíceis de 2020 e 2021 significaram uma diminuição daquele valor para 566k€. Contudo, prevê-se que em 2023 possamos aproximarmo-nos do milhão de euros. Esta trajetória é tão relevante quanto atentarmos ao facto de que, para além de nunca termos recebido qualquer apoio direto do Governo, também nunca tivemos que recorrer à Universidade para qualquer apoio adicional para fins de liquidez durante este período de tempo.

Estes são resultados que na minha opinião não têm sido devidamente reconhecidos pela Academia.

Contudo, há claramente muitas coisas que ficaram por fazer.

A nível organizativo permanece a frustração de haver cargos e respetivas funções na hierarquia dos Serviços que correspondem claramente a níveis de dirigentes de 3º nível e que nunca foram reconhecidas como tal. Exceto no Regulamento orgânico, votado em sede de Conselho Geral, que reconhece a sua existência, mas que infelizmente acabaram por não ter acolhimento efetivo com as respetivas aberturas de concurso.

Por outro lado, ao nível do investimento ficam por fazer obras importantes de reabilitação, construção e substituição de equipamentos - nos Pavilhões, nas Cantinas e nas Residências.

As dificuldades financeiras que os anos da pandemia causaram, adiaram inevitavelmente muitas destas iniciativas. Os resultados de 2019 davam, na altura, alguma perspetiva financeira favorável para, de um modo progressivo, se iniciar um programa de intervenções daquela natureza. Infelizmente aquelas perspetivas não se vieram a concretizar. Contudo, ainda se conseguiram melhoramentos substanciais na rede de Wi-Fi nas residências universitárias num valor total de investimento superior a 100K€. 

Finalmente, gostaria de reforçar a mensagem de que apesar das dificuldades dos anos da pandemia que afetaram sobremaneira a atividade dos Serviços, conseguimos não só sobreviver como também lançar raízes de desenvolvimento futuro numa dimensão que uma mera leitura dos indicadores financeiros não espelha na sua plenitude. Isto é, a capacidade produtiva instalada para responder a volumes da procura na alimentação, no alojamento e no desporto não reflete o verdadeiro esforço organizativo, de gestão, a resiliência e o compromisso dos recursos próprios dos Serviços que é expresso por orçamentos médios de (meros) 8 milhões euros.

De facto, este valor de receitas corresponde na verdade á venda de cerca de 500 mil refeições/ano, maioritariamente a 2.5€/unidade, á renda de cerca de 850 camas a 77,56€/mês e 4150 mensalidades a 21€ de utentes do desporto! Servimos perto de 3000 refeições/dia, gerimos diariamente o alojamento de cerca de 1300 estudantes e recebemos nos nossos Pavilhões de mais de 600 utentes

Em 2020, o mundo deparou-se com uma pandemia que a todos afetou, e os SASUM não foram exceção. Que consequências trouxe aos Serviços nas suas diversas áreas?

O impacto não foi uniforme nas diferentes atividades. Relativamente a 2019, no setor alimentar, as receitas próprias diminuíram 62% enquanto que as despesas diminuíram 36%, no alojamento a diminuição de receitas foi de 25% e nas despesas de 13% e no desporto as receitas diminuíram 69% relativamente a 2019 (um ano de Europeu de futsal) e as despesas diminuíram apenas 13,6%. Enquanto que as receitas estão relacionadas com níveis de atividade, as despesas têm elementos fixos importantes, nomeadamente as relativas aos recursos humanos. 

Qual o desempenho económico dos SASUM previsto para 2022, comparativamente com o ano anterior?

Em 2022 estamos a prever um resultado operacional negativo de cerca 105k€ comparado com o registado em 2021, igualmente negativo, mas de 830k€. Contudo, se considerarmos os resultados antes das depreciações, prevemos recuperar de um montante negativo em 2021 de 185k€ para um valor positivo de cerca de 620k€. Relativamente aos valores em banco, gostava de recordar o valor com que transitamos em 2019 – mais de €1.7 milhões de euros. Em 2020 esse valor baixou para pouco mais de 1 milhão, em 2021 para cerca de meio milhão de euros. Prevemos agora em 2022 terminar com mais de 680 mil euros em banco e em 2023 com 960k€. Um percurso muito difícil em 2020 e 2021 e uma tendência de recuperação em 2022 e 2023. Contudo, o meio ambiente económico mantém-se muito incerto com uma inflação nos preços dos bens energéticos a atingir valores muito preocupantes, assim como a dos bens alimentares. O que está verdadeiramente a acontecer é que o valor das receitas ainda em 2022 está a aproximar-se do montante de 2019, a preços de venda muito semelhantes, mas com o total das despesas a disparar, em resultado do aumento generalizado dos preços. 

Assumiu, no início do mandato, que a área do alojamento era uma preocupação sinalizada. Os projetos para duas futuras residências universitárias, em Braga e em Guimarães, viram as candidaturas submetidas no âmbito do PPR aprovadas muito recentemente. Qual o papel e contributo da Universidade, por via dos SASUM, neste dossier?

O papel dos SASUM na formulação das candidaturas submetidas e aprovadas foi, como seria expectável, crucial. Como é do conhecimento geral existem 2 candidaturas aprovadas - em Braga, em que a Camara Municipal é a promotora e em Guimarães, em que a promotora é a própria Universidade. Houve várias fases nestes processos, mas diria que a mais absorvente foi a que envolveu a construção das respetivas manifestações de interesse que fundamentaram as candidaturas formais. Os critérios de avaliação nacional compreenderam 3 áreas principais - inovação, eficácia e adequação da oferta à procura - que foram classificadas de 0 a 5. Os SASUM foram responsáveis pela última área (adequação da oferta à procura) em ambas as candidaturas. As pontuações atribuídas foram 4,21 e 4,03 respetivamente – a maior pontuação conseguida nas 2 candidaturas. Como é do conhecimento público, a gestão destas duas Residências foi atribuída aos SASUM e espera-se que as respetivas construções estejam concluídas no final de 2024.    

O desporto continua a ser uma das áreas de mais impacto na imagem nacional e internacional da Universidade. A aposta no desporto é e tem condições para continuar?

Claramente que sim. Os sucessos desportivos dos nossos atletas estudantes, quer individual quer coletivamente, a nível nacional e internacional, têm constituído trunfos importantes na captação de provas nacionais e internacionais para a Universidade do Minho e contribuído para a sua projeção também nesta área, bem assim como uma fonte importante de receitas. Mais recentemente, a atribuição à Universidade do Minho, pela FISU, do mais elevado grau de certificação (platina) do programa Healthy Campus, , assim como a atribuição, pela EUSA, da organização do Campeonato Europeu Universitário de Voleibol em 2023, constituíram mais um marco importante na afirmação dos SASUM. Temos que prosseguir este caminho.   

Assumiu o papel como o “maior desafio em termos de dimensão e de responsabilidade” da sua carreira. As expectativas confirmam-se?

Claramente que o posto de Administrador que ocupo há 5 anos constituiu o desafio mais importante nesse contexto. Tem a sua expressão na dimensão dos Serviços, de que falei anteriormente e que comporta 250 trabalhadores, e na responsabilidade da função, expressa pelas (amplas) competências atribuídas ao Administrador dos SASUM no contexto da autonomia administrativa e financeira de que os Serviços gozam e que está reconhecida nos Estatutos da UM. 

Fonte: SASUM

Fotos: Nuno Gonçalves

Arquivo de 2022