"Este parece ser o momento, em
parte devido à visibilidade de episódios agressivos com raparigas,
para começar a desenvolver uma agenda de intervenção, elaborando
programas específicos de género para estas jovens", diz Vera
Duarte, autora do doutoramento "Discursos e Percursos na
delinquência juvenil feminina", desenvolvido no Instituto de
Ciências Sociais da Universidade do Minho.
Os resultados indicam que as transgressões surgem da gestão de sentimentos negativos suscitados pelas histórias de vitimação, da procura de divertimento e risco, da influência de factores externos (amigos, namorados, drogas) e de determinadas casualidades. A maioria das entrevistadas do estudo partilha um "perfil-tipo" socialmente construído: adolescentes pertencentes a famílias economicamente desfavorecidas, desestruturadas na sua composição e nas dinâmicas relacionais, residentes em bairros sociais degradados, vítimas de maus-tratos e negligência, institucionalizadas e a frequentar grupos ou locais propícios à violência, com o consequente insucesso, desinteresse e abandono escolar, entre outros.
Contudo, com o objectivo de não reforçar preconceitos que depreciam os "pobres" e de construir "universalizações ocultas" sobre a rapariga delinquente, a investigadora aponta outra vertente: "Os comportamentos destas delinquentes desafiam os discursos dominantes ao mostrar que a transgressão feminina é, também, um processo de escolha, que alberga outras motivações", explica Vera Duarte. Embora as raparigas constituam uma pequena parte da delinquência em geral, os seus problemas reflectem questões sociais e factores de risco singulares. Foram encontrados junto das jovens em estudo vários desvios característicos da adolescência, nomeadamente consumos de álcool, tabaco e drogas, comportamentos de risco e de teste de limites associados à importância do grupo de pares e à necessidade de autonomização, fugas de casa, gravidez na adolescência, auto-agressividade, agressão verbal e relacional.
A investigação baseou-se na análise de 27 processos individuais e 19 entrevistas na área da Grande Lisboa, realizadas com raparigas internadas em centros educativos e a executar medidas não institucionais sob acompanhamento das equipas tutelares educativas. À semelhança da população carceral feminina, que ronda os 10 por cento do total, tanto em Portugal como na generalidade dos países da União Europeia e nos EUA, os números e os recortes nacionais da delinquência juvenil feminina não têm sido muito diferentes, apontando para uma variação que oscila entre os 7 e 11 por cento, de 2002 a 2009.
Vera Duarte tirou a licenciatura e o mestrado em Sociologia na UMinho, na qual está a concluir o doutoramento e é membro do Centro de Investigação em Ciências Sociais (CICS). Já foi docente na UMinho (2001-2004) e na Universidade Católica, em Braga (2001-2010). Actualmente, dá aulas na licenciatura em Criminologia do Instituto Superior da Maia e faz supervisão externa num Lar de Infância e Juventude. A investigadora centra os estudos nas áreas da sociologia do desvio, da criminologia e da delinquência juvenil.
Contactos:
Vera Duarte | E-mail: veraduarte77@gmail.com
(Pub.Jul/2011)