Os magistrados judiciais explicam que a atribuição de guarda às mulheres deve-se ao seu papel, culturalmente enraizado, na educação e nas tarefas de cuidado relativas às crianças durante o casamento e após a separação. Estas são as conclusões preliminares do doutoramento de Ana Reis Jorge, do Departamento de Sociologia da Universidade do Minho
O número escasso de recursos face às decisões judiciais demonstra uma "interiorização de papéis de género por parte de homens e mulheres", diz a socióloga. Além disso, a morosidade dos processos, a rejeição de uma exposição pública e a noticiada descrença face à justiça também pode contribuir para esta aceitação.
"Por mais que vários factores sejam ponderados aquando da tomada de decisões, a influência da denominada 'figura primária de referência' [tendencialmente a mãe] é notória. Não negando a relevância dos avanços na defesa da igualdade entre homens e mulheres, nomeadamente após a Revolução de Abril, verifica-se ainda a persistência de importantes assimetrias em diversas dimensões da vida social, nomeadamente na divisão sexual do trabalho, no controlo do espaço doméstico e nos contextos institucionais, inclusive ao nível do poder judicial", reforça Ana Reis Jorge.
Criar mecanismos para assegurar a aplicação de uma legislação igualitária
Continua a existir, contudo, um desfasamento entre a lei e as práticas sociais: "A uma legislação tendencialmente igualitária parecem opor-se resultados indicadores da persistência e reprodução de claras desigualdades de género, para não falar grosso modo numa prática discriminatória", afirma. Sugere que a implementação de uma legislação igualitária seja acompanhada pela criação de mecanismos para a sua efectiva aplicação e pelo comprometimento político-institucional de uma mudança nas diferentes esferas da realidade social.
O trabalho "Divórcio e responsabilidades parentais: padrões de género nos contextos familiares e nas decisões judiciais" visa principalmente analisar a actuação da justiça neste âmbito, bem como conhecer os trajectos, as percepções e as estratégias de indivíduos divorciados na condução de processos de regulação do exercício das responsabilidades parentais. Está a ser desenvolvido no âmbito da tese de doutoramento "Desigualdades de género: processos de ruptura conjugal e subsequente tutela das crianças", orientada por Manuel Carlos Silva, da UMinho, e Anália Cardoso Torres, do ISCTE.
Ana Reis Jorge é licenciada em Sociologia pela Universidade do Minho. Trabalhou como bolseira do projecto "Mestrados em Portugal: modelos socioculturais de persistência entre homens e mulheres". É investigadora do Centro de Investigação em Ciências Sociais (CICS) e colabora no projecto "Desigualdades de género no trabalho e na vida privada: das leis às práticas sociais". Tem apresentado comunicações em eventos científicos nacionais e internacionais, publicado artigos na área dos estudos de género e globalização e movimentos sociais e participado na organização de congressos.
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Ana Reis Jorge | E-mail: ana.j.mr@gmail.com
(Pub.Mai/2011)